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Estas são conversas de um país que, estando em crise, vive apesar dela. Neste espaço fala-se de um Portugal que ainda consegue ser belo, de um GoCar feito playboy e de uma viagem que sempre quis fazer.
O outro Algarve - Serra de Espinhaço de Cão
Serras - Carrapateira
Aljezur fica guardada para regresso. Daí até um pouco mais abaixo entra-se num Algarve desconhecido, serrano, pastorício, verde. Os morros aparecem feitos bossas de camelos num perímetro desmarcado e sem ordem. Primeiro os de Monchique, logo de seguida os de Espinhaço de Cão. O Dinis tem-se portado tão bem que me conseguiu desenvolver a alucinação de lhe dar festas de lado de vez em quando, mais ou menos em palmadinhas, como se fazem aos cavalos.
Os subires e os desceres só acabam já perto do extremo ocidente, nessas três penínsulas que descem abruptas no Atlântico. Uma, a Norte, é o Cabo de São Vicente, associada a muitas lendas entre as quais aquela que deu um brasão e um santo a Lisboa. Outra, a mais a sul e mais a oriente, é a Ponta da Atalaia, o dedo mais pequeno do trio. Finalmente, ao meio, onde está a virtude, impera o cabo de Sagres. Não é exagero dizer que há em Sagres um fim de um mundo, e por continuidade, o início de um outro. É provavelmente o exemplo maior de finisterra entre as dezenas de finisterras portuguesas. Portugal é, por si só, no seu conjunto, uma finisterra, onde a terra acaba e o mar começa. Esta faixa atlântica, não esquecendo a da Galiza, termina a Europa continental. Mas em Sagres, a pontinha da unha, pega no fatalismo e leva-o para outros termos. Desta falésia de calhaus farpados, se divagarmos a vista ao longo do sudoeste que nos galvanizou a história nacional, percebemos o portento do sonho humano. Não é de admirar que o saber popular ainda conserve os contos e mitos que navegam entre estes cabos confinantes. De estranhar é que um país Cristão há tantos e tantos anos, ainda arrecade a superstição de não se poder vir para aqui quando a escuridão chega, porque é neste palco desmedido que, segundo crença, os Deuses se reúnem durante a noite. Não acreditando, estive lá hoje e acreditei.
Moinhos e torre de água - Vila do Bispo
Vista para o Cabo de São Vicente - Sagres
O último calhau europeu - Sagres
A viragem para Este tem um pouco de anti-clímax. Lagos é uma bela cidade, nem se discute. É talvez a que mais gosto do Algarve a cheirar a mediterrâneo, batendo-se de igual para igual com Tavira. Mas sair da injecção espiritual de Sagres e dar de caras com as capitais turísticas do país tem um quê de conflito. Lagos continua a ser portuguesa, mas conta com muitos apesares. Nesse sentido, há uma marcada diferença, da longa marginal que vai daqui e tem estação final em Vila Real de Santo António, para o resto do país. Eu acho piada à invasão bife. Acho mesmo. Baralha a genuinidade, repinta uma coisa que já tinha marca de água, compromete a pureza, mas, enfim, desculpa-se. Nada tem de mudar por obrigação, nem nada tem de estagnar por obrigação. O Algarve, nos últimos cinquenta anos, mudou. Mudou muito. E foi mudado maioritariamente por gente de fora. Se assim não fosse, teríamos hoje uma costa diferente, sem dúvida mais rústica, também sem dúvida mais pobre, que se calhar prolongava a costa vicentina, em curva, e dava a mão à ria formosa. Talvez fosse assim. Não foi. Resta aproveitar. A verdade é que sem esta nova cara, o Algarve jamais me permitiria dormir com um indiano numa camarata, como vai acontecer hoje. Avante. Vou beber essa bebida muito típica da zona, logo a seguir à aguardente de medronho: a pint de Guiness.
Farol - Sagres
Quiosque - Lagos
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