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Qual crise?

Estas são conversas de um país que, estando em crise, vive apesar dela. Neste espaço fala-se de um Portugal que ainda consegue ser belo, de um GoCar feito playboy e de uma viagem que sempre quis fazer.



Quarta-feira, 05.12.12

Da Nazaré a casa - Parte II

 

Irrita-me aquele bairrismo muito português de se dizer à boca cheia, e sempre através de diminutivos, que o nosso vinhinho é do melhor do mundo, e o nosso queijinho é do melhor do mundo, e o nosso presuntinho é do melhor do mundo. Primeiro porque teria de conhecer todos os vinhinhos e queijinhos e presuntinhos do mundo para dizer tal coisa com algum sentido racional. Segundo porque já provei vinhinhos italianos, queijinhos franceses, e presuntinhos espanhóis, tão bons ou melhores que os nossos.

Quando tive a ideia desta viagem, não tinha qualquer objectivo de elevar o país a um dos melhores. É ignorante pensar dessa forma porque tenho bem mais de noventa por cento de um planeta por descobrir.

O que quis, sem ser chato na escrita, foi mergulhar num Portugal que não se vê à superfície, e garanto que qualquer pessoa que tiver coragem para ir lá abaixo, às suas profundezas mais ocultas, descobre tesouros que não fazem parte dos guias que se compram antes de partir para um sítio qualquer. Tenho um manifesto desprezo por quase todos os catálogos de igrejas, de cidades, e de castelos que andam por aí, porque não transmitem o que importa. Uma obra ou um ritual humano tem sempre uma justificação, um propósito, um sentimento. É isso o que mais me espicaça a curiosidade, caso contrário não passam de gestos ou edifícios, e estou-me mais ou menos nas tintas para o mês em que foram concluídos. O fascínio das pirâmides egípcias não está na pedra, mas na causa, o por quê. Nesse aspecto, Portugal ganhou por andar mais atrasado em relação a uma europa que se deixou afectar por um conceito de progresso, e guardou um folclore que é precioso, mágico, e por vezes incompreendido. Qualquer sinónimo de evolução dirá que não faz qualquer tipo de sentido ainda existirem manifestações como as dos Caretos de Podence em pleno século XXI. E aí respondo que quem está mal é toda esta conversa de termos de andar atrás do progresso como um galgo vai à cauda de um coelho. Não há nação que sobreviva sem identidade. Nem uma. Caso contrário passa de referência cultural ou etnográfica a mera referência geográfica. 

Nesse sentido, e aqui partilho outra meta que tinha quando peguei em pena e papel, quis mostrar a identidade portuguesa, que só é possível dividindo-a em muitas outras, porque este país não é, de todo, uno. O cantor Andrew Bird, quando cá aterrou, decidiu percorrer Portugal de norte a sul, e ficou altamente impressionado como num território tão pequeno pode habitar tamanha diversidade, numa dose que não se encontra em espaços bem maiores, como, por exemplo, em França. Isto é absolutamente verdade. Entendo perfeitamente que um alentejano tenha mais tema de conversa com um extremeño do outro lado da fronteira do que com um minhoto, como um minhoto terá maior proximidade com um galego do que com um transmontano, como um transmontano sentirá uma afinidade cultural com a província de leão que não partilha com um algarvio, como um algarvio deverá olhar para o norte de África e encontrar um reflexo de si próprio que dificilmente vê das suas serras para cima. Tudo isto é reconhecível a qualquer um dos sentidos. E Portugal só se assimila e se compreende integralmente se o virmos neste grande mosaico de cores. Se lá chegarmos, e o virmos bem de cima, aí sim, damos com uma inesquecível obra de arte, em que os monumentos e a paisagem valem nada quando comparados com o rito, a ideia, a alma, a saudade.

Por aí, e podem-me acusar do provincianismo que bem vos der na tola, digo-o sem ter de pontuar a coisa com reticências: Portugal é uma obra-prima.

Talvez um dia ele acabe. Porque os países acabam, como as estrelas e as pessoas. Mas uma lembrança só termina se não se merecer lembrá-la. E vão-se lembrar de Portugal. Não só porque ele mereça ser lembrado mas porque qualquer boa gente merece lembrar-se dele.

 

Obrigado Dinis, meu amigo.

 

Darei notícias em breve. É uma promessa.

Autoria e outros dados (tags, etc)

por Ricardo Braz Frade às 19:02


1 comentário

De Helena a 06.12.2012 às 12:07

Vou passando então por aqui à espera dessas notícias. Até lá,

um abraço

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